No meme intitulado “Bodes de Dieta”, a fusão entre a figura humana e cabeças de bode introduz uma atmosfera de comicidade instantânea. O diálogo gira em torno da decisão de se embarcar em uma jornada de dieta e ilusões. Essa situação desencadeia uma reflexão sobre a contínua luta contra as tentações alimentares tão prevalentes na sociedade contemporânea, aqui entendidas como algo que se quer comer fora da dieta, mas não é permitido. Frequentemente se constituem como opções culinárias interditadas como alternativas saudáveis. Há um jogo de palavras no reconhecimento dessa interdição como algo inevitável e desagradável.
Nesse contexto, o termo e a imagem dos “bodes” adquirem uma conotação associada à expressão coloquial “estar de bode”, usada para indicar um estado de aborrecimento, tristeza ou desânimo. A expressão é usada informalmente em algumas regiões para comunicar uma sensação de mal estar de quem exagerou na ingestão de algo, de algum modo, e está sofrendo as consequências. Ganha nova camada de significado quando aplicada à experiência de aderir a uma dieta, onde renunciar a prazeres culinários pode parecer tedioso e desafiador, em sintonia com a ideia de corpos em conflito consigo mesmos em busca por alívio diante do sofrimento.
Segundo Barcellos e Carvalho, no capítulo Cidade como espaço social de consumo simbólico de alimentação saudável, “a sociedade contemporânea se impõe saberes e couraças para compreender fenômenos comunicacionais e consumos que se desenrolam nas tramas das lógicas capitalizáveis, impactando os corpos que internalizam uma luta interna por alívio do sofrimento” (2023, p. 320). Nesse sentido, o consumo revela códigos de identificação que fluem na cultura local das cidades, no caso de alimentos saudáveis, e conferem distinções aos consumidores. O deslocamento de significados simbolizados nesses códigos denuncia padrões que estão naturalizados através do estranhamento. O estudo sobre o simbolismo dos consumos aprofunda o processo de significação, tornando-o perceptivo e compreensível através dos fenômenos comunicacionais.
A segunda parte da imagem revela frutas adornadas com etiquetas que as nomeiam como outros alimentos considerados menos saudáveis, sugerindo uma tática divertida para driblar as tentações: pelo nome sugerido na etiqueta o alimento estaria dentro da lista dos alimentos considerados saudáveis pelo padrão. Esse gesto humorístico espelha estereótipos do cotidiano, cujas interpretações quando naturalizadas sobre alimentação saudável impedem a percepção da potência humana de ressignificar, pois os códigos de identificação do saudável são constantemente redefinidas e influenciadas pelos fluxos de significados circulantes, conforme apresentam Barcellos e Carvalho (2023, p. 320): “transitamos entre fluxos de sentido de fenômenos que emergem, [que] são reforçados ou reconfigurados na tessitura da vida urbana; entre eles, destaca-se o tema da alimentação saudável”.
O meme “Bodes de Dieta” captura de maneira perspicaz a complexidade da sociedade que se vê desafiada por dinâmicas comunicacionais e de consumos. Enquanto isso, os indivíduos travam uma batalha interna na busca por escolhas alimentares consideradas mais saudáveis. Ao amalgamar a figura dos bodes com as expressões “Tô de bode!” e “corpos em conflito consigo mesmo na busca por alívio do sofrimento”, bem como à representação visual das frutas disfarçadas com nomes de salgados, o meme ressoa com as análises apresentadas no referido capítulo, que integra a obra Corpos e Comensalidades em Discursos, 14º volume da Série Sabor Metrópole, que será lançada no 2º semestre deste ano.